quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

O Anti-Poder Cultural


Desde os primeiros grupos humanos deter o poder era o objetivo principal de alguns indivíduos. Até aí tudo bem. Mas quando o poder obtido era usado para promover o bem estar do chefe – como a construção de uma fortaleza com algum luxo – ou para satisfazer seus desejos em detrimento da segurança e paz do seu povo, a sociedade começou a buscar formas de se opor a ação do poderoso. Mas tanto a oposição política quanto as revoluções apenas substituíam um poder por outro ainda pior e depois de muitas experiências a sociedade procurou uma outra forma de enfrentar um governo insatisfatório, as manifestações de anti-poder. Este termo foi criado pelo cientista político da Univ. de Edimburgo, na Escócia, John Holloway, no livro Mudar o Mundo Sem Tomar o Poder. Esse professor analisou as ações “daqueles que excluíram a hierarquia, daqueles que questionaram teorias e daqueles que lutaram e morreram na resistência contra os abusos de poder”. Um dos exemplos estudados por ele foi dos zapatistas no México. Este movimento que aconteceu em 1910 com Emiliano Zapata e renasceu com os índios chiapas que empreenderam uma marcha que começou no sudeste do país, durou 37 dias, atravessou 13 estados e chegou a cidade do México com a intenção de chamar atenção do mundo para os desmandos do governo e a corrupção do Legislativo e do Judiciário. O movimento anti-poder tenta mudar a atitude dos governantes sem tentar colocar outros políticos no lugar, “anular todas as formas de autoritarismo e ativar a participação”.
Mas no sábado, 16/02/2008, O Globo no caderno Prosa & Verso resenhou o livro da Dra. Lúcia Maciel Barbosa de Oliveira que estuda uma forma de anti-poder que vem ganhando força desde o ano 2000, a “resistência como ação cultural e não mais como ação política”. O exemplo maior é o da internet: “Estas ações culturais crescem e ganham adeptos no vácuo do descrédito com as instituições tradicionais e com a estrutura de representação, ainda uma precondição para o exercício político”. Ela cita o filósofo Michel Foucault ensinando que “o poder usa mecanismos institucionais capazes de gerir o tempo e normatizar o uso do espaço para disciplinar a sociedade”, tais como a fábrica, a escola, as festas e o quartel que mantém as pessoas confinadas a locais produtivos por um período de tempo diário. Mas agora os aparatos tecnológicos usam uma multiplicidade de manifestações, um conjunto de ações culturais, que defendem uma sociedade livre das relações de poder e que pretendem estar fora da política tradicional. As mudanças democráticas ocorreriam “no comportamento singular de cada um e não como instituição de um modelo político”.
Quando vemos um político roubando insaciável precisamos ver se ele foi eleito por nós, neste caso precisamos participar em chamar atenção do incauto. Escrever email para o gabinete dele é a coisa mais fácil. Entrando no site da Assembléia Legislativa estadual ou da Câmara federal ou do Senado a gente descobre o site do pilantra e podemos tentar tocar em algum resto de vergonha que ele tenha. E participar ou até criar algum movimento a favor da ética, o que pode ser ligado a alguma atividade cultural, como uma comemoração popular. Você pode dizer que não tem pretenção política, mas é isto mesmo, é o anti-poder, a gente busca mudanças e melhoras sem querer o poder e as obrigações que ele traz.
Porém, como nosso tempo de modernismo tem como principal característica a relatividade, o fugir de afirmações, a professora Lúcia diz temer que o anti-poder cultural “uma vez transformado em ações políticas de um novo projeto de democracia passaria a se inscrever nas próprias estruturas que contesta e estaria morto por falta de oxigênio”, porque para os que vivem neste pequeno planeta no meio do nada não há lado de fora.